Interpretação
bíblica do Salmo 15
Mario Marcos Andrade da Silva*
Introdução
Este trabalho pretende ser uma
interpretação bíblica sobre o Salmo 15, nosso objeto de estudo. Para tais
propósitos vamos utilizar ferramentas exegéticas, elas nos ajudam a conhecer o
texto na sua forma e conteúdo. Abordaremos os seguintes itens: tradução do
texto, data, autoria, lugar, gênero literário, forma e poesia, finalmente
assunto de interpretação. Além do mais, forneceremos uma conclusão que possa
ter relevância em nossa atualidade.
1Senhor,
quem será recebido em sua tenda?
Quem habita na montanha santa?
2 O
homem de conduta íntegra
que prática a justiça
e cujos pensamentos são honestos.
3Ele
não deixou à solta sua língua,
não fez mal aos outros.
nem ultrajou seu próximo.
4A
seus olhos, o reprovado é desprezível;
mas ele honra os que temem o
Senhor.
Se se prejudicar em um juramento,
não se retrata;
5não
emprestou seu dinheiro com usura,
nada aceitou para deitar a perder
um inocente.
Quem age assim permanece
inabalável.
2.
Data, autoria e lugar
A datação do Salmo é problemática
pelo seu caráter poético. No entanto, tentaremos algumas aproximações a partir
das dicas fornecidas pelo mesmo texto.
O Salmo carece de informações
históricas concretas, entretanto, fala de “tenda” (v.1). A referência pode nos
indicar que o texto pertence à época pré-exílica. Também ele se encontra entre
a coleção dos salmos de Davi que, segundo as pesquisas podem ser localizadas em
tempos da monarquia.[2]
No que concerne a autoria do Sl 15
consideramos o seguinte: aparentemente pertence a Davi porque afirma o
cabeçalho. Mas a comunidade acadêmica tem mostrado que estes títulos foram
acréscimos posteriores.[3]
Porém, não sabemos quem é o autor do Salmo. Ele se apresenta como uma homenagem
ao rei Davi.
Em relação ao lugar, sendo o Sl 15
um fragmento antigo de uma liturgia (v.1a), isto pode nos indicar que o
salmista encontrava-se no templo, local onde se reunia a comunidade cultual de
Jerusalém (Sl 24,3; 33,14; 125,2).
3.
Gênero Literário
Segundo Bortolini, trata-se de uma
liturgia semelhante ao Sl 24.[4]
Outro estudioso do saltério, Derek Kidner, também considera que se trata de uma
liturgia e o compara a outros textos veterotestamentários como Ex 19,10-15; 1
Sm 21,4-5.[5]
Podemos dizer que se trata de um
salmo litúrgico, pois sua forma e conteúdo mostram parte do acontecimento
cultual no templo (v.1).
4.
Forma e Poesia
Cabeçalho:
salmo davídico
Frase
principal: Senhor, quem habitará no teu tabernáculo? (v.1)
Primeira
estrofe: Critérios para entrar no templo. (v.2-5a)
Frase
conclusiva: Quem assim procede nunca será abalado? (v.5b)
Com relação à poesia do Sl 15
podemos considerar sua característica hebraica. Ela se distingue pelo seu modo
de repetir o sentido de suas frases. Por exemplo: ao observar o v.1 notamos que
a palavra “hospedar-se” pode funcionar como paralelo de “habitar”; enquanto que
“tenda” pode ser analisada junto à expressão “monte sagrado”.
No v.2, a expressão “anda com integridade”
vai unida a “pratica da justiça”. Igualmente “falar a verdade” se relaciona
antonimamente com “deixar a língua correr”.
“Lesa seu irmão” tem conexão com “insultar ao próximo” (v.3). E
“desprezar o ímpio” se mostra como ação contraria a “honrar os que temem a
Javé” (v.4a). A ação de “jurar com dano próprio” devem ser estudados,
especialmente, com a frase “não emprestar dinheiro com usura” e “nem aceirar
suborno” (v.4b-5a). Depois observamos que o texto termina com uma frase
conclusiva “quem age deste modo jamais vacilará” (v.5b). Ela conecta com o
sentido da primeira frase do Salmo (v.1), deixando o texto como uma unidade
literária coesa.
5.
Assunto de interpretação
O Salmo mostra um padrão de
perguntas e respostas. No seu contexto vital existe uma controvérsia em torno
da ética para habitar ou entrar no santuário. A teologia do texto se encaixa
dentro da tradição profética (Isaías, Miquéias e Amós) que denuncia a
exploração justificada pela religião.
Vemos no primeiro versículo que o
salmista faz um questionamento como introdução que dará o tom para o
desenvolvimento do texto. É importante destacar a imagem do monte santo, porque
segundo a tradição do êxodo (Ex 3.1; 19.2; 24.12), era o lugar de encontro com
Deus. Porém, quando o salmista se empenha em indagar quem teria condições para
entrar no templo, procura pôr os critérios para quem pretenda se encontrar com
Deus.
No v.2 o salmista começa a indicar
esses critérios destacando a prática da justiça, que segundo Isaías 33.15,
podemos entender como falar com retidão, ou seja, falar a verdade, que indica
um verdadeiro interesse pelo próximo sem buscar benefícios para si; não tirar
proveito de pessoas que estão em situação desfavorável; respeitar o direito do
próximo e não ter prazer na violência.
A partir do v.2 se constata que,
para a teologia do salmista, a ética cotidiana não estava separada das
celebrações litúrgicas. Tudo indica que o espaço sagrado exigia níveis
profundos de transformação pessoal.
O Salmo destaca o adequado uso da
língua (v.2b-3). Segundo outros textos contemporâneos, a língua podia ser
comparada com uma “espada afiada” (Sl 52,4), pelo seu poder de ferir e matar.
E, também, como o mesmo texto indica, a língua parecia ser o médio eficaz para
“lesar o irmão”, “insultar” (v.3), planejar usura (v.5a), “subornar”
(v.5b). O mau uso da língua procura prejudicar
o outro (Pv 6,19), e revela, segundo o conteúdo do texto, dois projetos de vida
diferentes: o dos ímpios (v.4a) e o dos que temem a Javé (v.4b).
Logicamente que o Sl 15 apresenta
a teologia da retribuição: separação de justos e pecadores e a visão de um Deus
que acolhe os bons e despreza os ruins. Mas, o nosso interesse vai se centrar
no aspecto de que não se pode servir a Deus sem servir aos irmãos (v.2-5).
O salmista encerra respondendo a
pergunta inicial (v.1) com relação aos que podem entrar ou habitar no monte
santo: os v.2-5 deram a resposta. Os que praticam estes preceitos, também
localizados em outras referencias bíblicas, (Ex 22.25, Lv 25.35-37; Dt 15.2)
estão em sintonia com o desejo de Deus.
Algumas questões
para refletir:
Que lugar ocupa Deus na minha vida?
Que lugar ocupam meus irmãos? Onde termina um, onde começa o outro? Existe um
limite realmente? Nossa ética está em harmonia com os “sonhos” de Deus? Como
tornar a pratica da justiça eficaz em nossas comunidades?
Respondendo estas perguntas, também
saberemos como é nosso encontro com Deus.
*O autor é bacharelando em teologia pelo (ICEC)
Instituto Cristão de Estudos Contemporâneos, além de especialista em
escatologia e angelologia pelo Ide Missões.
[1]
Tradução do texto extraído da Bíblia Tradução Ecumênica, São Paulo, Loyola,
1994.
[2] Nome do autor, Título do livro, Lugar, Editora, Ano,
p.15.
[3] José Bortolini, Conhecer e rezar os salmos, São Paulo,
Paulus, 2006, p.11-12.
[4] José Bortolini, p.70.
[5] Derek Kidner, Introdução e comentário dos salmos, São
Paulo, Vida Nova, 1992, p.97.
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